sábado, 23 de junho de 2012

Caçadora de canções

Imagem do show Saudade do Brasil

Tudo que Elis Regina gravou soa bonito e de bom gosto. E letra de música que ela farejasse, logo seria rebento, florescia, colhia-se... Uma glória àquele que compunha, o que aconteceu com todos que ela pôde lançar, a exemplo de Milton Nascimento: depois de Elis ouvir mais de vinte daquelas, perguntou: "Não tem mais outra?" E ele cantou "Canção do Sal", a última do bisaco das canções, a qual Elis gravou no Lp Elis/68 e estourou: "Tudo que eu passei a escrever era pensando nela", declarou ele. O Baterista do Bossa Jazz Trio, José Roberto Sarsano, tem muito carinho por esse disco.
Agora arrependida ela ficou quando Chico Buarque apresentou a catilinária de suas canções, essas de cunho político-social; diretamente dirigidas aos temíveis ditadores da época, e outras composições que mantinham a criticidade e sutileza característica de um grande compositor. Em seguida, a bossanovista, Nara Leão, a quem Elis não cansava de acertar-lhe a lança afiada do verbo, surge com um Lp do jovem poeta: "Eu sou esquentada. Tem gente que é calma, a Nara Leão, por exemplo, é uma pessoa que tem uma paciência histórica, sentou, esperou tudo acomodar e fez um disco certo. Aliás, ela sempre faz as coisas certas nas horas corretas e para as pessoas exatas. Eu sou guerreira e pego a metralhadora para sair atrás de quem me enche o saco". Havia, portanto, um ranço entre elas devido a relação com o compositor Bôscolli. E com Maysa Matarazzo também foi assim: o aroma de Ronaldo estava no ar, mas não podia ser aspirado pelas duas. E antes de Elis casar-se com o tal galã, um dia elas se cruzaram pelos corredores da fama e Maysa adiantou-se: "Dizem que você anda me imitando, quero ouvir". Elis, prontamente, cantou quase que fuzilando: "Ouça vai viver a tua vida..."
O cearense Fagner relata que teve muito apoio da cantora, então casada com o fenomenal Bôscolli, à época de sua chegada ao Rio. Elis gravaria, de autoria daquele, umas três faixas no LP/72, mas só incluiu Mucuripe.  Gil era outro nome que ela não deixava de incluir em seus discos, depois veio Belchior, João Bosco e Aldir Blanc. "Dizem que sou eu que tem pé quente, mas eu só atiro, quem mata é Deus", brincava. Uma exímia caçadora de canções, porque trazia o raio X de grande leitora, muita sensibilidade, visgo: havia um traço de co-autoria em tudo que ela gravasse.


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